Saudade

Em cada dia que passa vais virar mais uma folha de um livro que é a tua vida. Em cada folha de outono folha que já não tem vida vem da árvore despida e nua. Vem da alma despida e crua. Se algum dia sentiste o amor de peito aberto sentiste a dor. Os anos passaram por ti e tudo que sentiste foi com paixão com ardor. Aprende sempre a sorrir o amor compartir... Paulo Pereira

A Vida

A Alvorada foi risonha,
Ergueste-te com o dia.
Eu fiz, naquela alvorada,
Uma alegre profecia.

Inda radiava fulgente
Vénus, a saudosa estrela,
Já tu ornavas as tranças
E cantavas à janela.

E dos laranjais vizinhos
Os rouxinóis acordados
Respondiam-te com trinos
Da tua voz namorados.

Dos virentes jasmineiros,
Que a primavera enflorava,
Vinha cheio de perfumes
O vento que te beijava.

Quem dissera então ao ver-te
Nessa risonha alvorada,
Que à noite, estrela cadente,
Serias inanimada?

Beleza pura

Feia ou bela, para longe
Desterra tanto aparato
Não se faz o hábito o monge
Sem ele a bela se enfeita
E nada à feia aproveita

Que pedras mais preciosas
Que enfeites de mais valor
E que flores mais mimosas
Do que uns olhos radiantes
Umas tranças abundantes
Uns lábios dizendo amor

E vós feias, se a beleza
Vos negou seu galardão
Não fujais da singeleza
Não busqueis o extremo oposto
Deixai de adornar o rosto
E adornai o coração

Paulo Pereira

Epitáfio para um poeta

As asas não lhe cabem no caixão!
A farpela de luto não condiz
Com seu ar grave, mas, enfim, feliz;
A gravata e o calçado também não.
Ponham-no fora e dispam-lhe a farpela!
Descalcem-lhe os sapatos de verniz!
Nao vêem que ele, nu, faz mais figura,
Como uma pedra, ou uma estrela?
Pois atirem-no assim à terra dura,
Ser-lhe-á conforto:
Deixem-no respirar ao menos morto!

José Régio - o poeta de deu nome a Vila do Conde no mundo

Declaração de Amor

(e o poeta cai na armadilha)

Ó maravilha! Voará ainda?
Sobe e as suas asas não se mexem?
Quem é então que o leva e faz subir?
Que fim tem ele, caminho ou rédea, agora?

Como a estrela e a eternidade
Vive nas alturas de que se afasta a vida,
Compassivo, mesmo para com a inveja...
E quem o vê subir sobe também alto.

Ó albatroz! Ó minha ave!
Um desejo eterno me empurra para os cimos
Pensei em ti e chorei.
Chorei mais e mais... Sim, eu amo-te!

Friedrich Nietzsche, in "A Gaia Ciência"

Eu não estou bem!

Se me perguntares como me sinto

Dificilmente vou sorrir

Dificilmente conseguirei dizer que está tudo bem

Sentirei um calor

Algo fervoroso vindo de ti

Mas não estou bem…

Desculpa…

Por melhor razão que venhas…

Por tudo aquilo que possas querer dar-me…

Eu não estou bem!



Lamento…

Na verdade já estive bem pior…

Tu sabes…

Tu fizeste sempre para estar lá…

Deste o melhor do pouco que podias dar

Lamento que hoje não me possas ajudar

Mas a vida assim o quer

Hoje, amanha, depois…

Eu não vou estar bem

Não estou bem…

Desculpa…

Perdoa-me…

Mas não tenho culpa…



Sei porque existes

Sei porque aqui estás

Porque me estendes a mão

Porque tentas chorar comigo

Porque tentas entender o sofrimento

Eu entendo…

Mas por favor não fiques…

Deixa-me aqui

Eu não estou bem…

Agora não me podes ajudar

Quero estar sozinho

Não quero sorrir

Quero somente reflectir sobre o meu sofrimento

Obrigado

Bem tentas…

Tentas ser algo que não podes ser neste momento

Mas eu não estou bem

Não adianta

Lamento…



Entendo-te…

Estou a sentir-te….

A sentir o teu calor…

Algo estranho que não é aquilo que realmente eu quero

Mas é calor…

Aquece-me…sim…ferve em mim…

Mas não é isto que preciso…

Lamento…

Tudo o que quero agora…

É estar aqui…

A sofrer….sozinho e na escuridão

Não quero esse calor… isso que me trazes…

Nada serve nesta hora…

Talvez sirva…

Serve para me confortar um pouco…

Para me fazer alucinar

Mas não me vai deixar bem

Não vou sorrir

Não é do fundo

Lá do fundo do meu coração…

A máquina está fraca…

Não tentes mais…

Deixa estar…

Prometo que vou melhorar…

Não sei quando…

Só sei que eu não estou bem!

Não chame o meu amor de Idolatria
Nem de Ídolo realce a quem eu amo,
Pois todo o meu cantar a um só se alia,
E de uma só maneira eu o proclamo.
É hoje e sempre o meu amor galante,
Inalterável, em grande excelência;
Por isso a minha rima é tão constante
A uma só coisa e exclui a diferença.
'Beleza, Bem, Verdade', eis o que exprimo;
'Beleza, Bem, Verdade', todo o acento;
E em tal mudança está tudo o que primo,
Em um, três temas, de amplo movimento.
'Beleza, Bem, Verdade' sós, outrora;
Num mesmo ser vivem juntos agora.

William Shakespeare

Pensamento do dia

"Gostar é provavelmente a melhor maneira de ter, ter deve ser a pior maneira de gostar."
José Saramago

De almas sinceras a união sincera
Nada há que impeça: amor não é amor
Se quando encontra obstáculos se altera,
Ou se vacila ao mínimo temor.
Amor é um marco eterno, dominante,
Que encara a tempestade com bravura;
É astro que norteia a vela errante,
Cujo valor se ignora, lá na altura.
Amor não teme o tempo, muito embora
Seu alfange não poupe a mocidade;
Amor não se transforma de hora em hora,
Antes se afirma para a eternidade.
Se isso é falso, e que é falso alguém provou,
Eu não sou poeta, e ninguém nunca amou.

William Shakespeare

O mundo quer-me mal porque ninguém
Tem asas como eu tenho! Porque Deus
Me fez nascer Princesa entre plebeus
Numa torre de orgulho e de desdém.

Porque o meu Reino fica para além ...
Porque trago no olhar os vastos céus
E os oiros e clarões são todos meus!
Porque eu sou Eu e porque Eu sou Alguém!

O mundo? O que é o mundo, ó meu Amor?
O jardim dos meus versos todo em flor...
A seara dos teus beijos, pão bendito...

Meus êxtases, meus sonhos, meus cansaços ...
São os teus braços dentro dos meus braços,
Via Láctea fechando o Infinito.

Florbela Espanca

Coisa Amar

Contar-te longamente as perigosas
coisas do mar. Contar-te o amor ardente
e as ilhas que só há no verbo amar.
Contar-te longamente longamente.

Amor ardente. Amor ardente. E mar.
Contar-te longamente as misteriosas
maravilhas do verbo navegar.
E mar. Amar: as coisas perigosas.

Contar-te longamente que já foi
num tempo doce coisa amar. E mar.
Contar-te longamente como doi

desembarcar nas ilhas misteriosas.
Contar-te o mar ardente e o verbo amar.
E longamente as coisas perigosas.

Manuel Alegre

Quiseste expor teu coração a nu.
E assim, ouvi-lhe todo o amor alheio.
Ah, pobre amigo, nunca saibas tu
Como é ridículo o amor... alheio!

Mário Quintana

Abismo

Olho o Tejo, e de tal arte
Que me esquece olhar olhando,
E súbito isto me bate
De encontro ao devaneando —
O que é sério, e correr?
O que é está-lo eu a ver?
Sinto de repente pouco,
Vácuo, o momento, o lugar.
Tudo de repente é oco —
Mesmo o meu estar a pensar.
Tudo — eu e o mundo em redor —
Fica mais que exterior.

Perde tudo o ser, ficar,
E do pensar se me some.
Fico sem poder ligar
Ser, idéia, alma de nome
A mim, à terra e aos céus...

E súbito encontro Deus.

Fernando Pessoa

Quando Você prejudicou-se
Na vida...
Eu sofri por você!
Quando eu e você sorria
Algo de nós chorou...
Quando dormíamos
Os lençóis fugiam
Corpos quentes banhos
Arrepiavam
Os medos da vida
Aventuras e mas nada enfim...
Quando você saia
Escondia
Quem ficava em casa?
Quando eu chegava
As roupas lavadas sumiam...
Como livro sagrado no cantinho
Tá chegando o quê?!
Na janela sonhos, na porta apenas os chinelos
Caminha eu e você...Amanhã
Ontem...Sim aí éramos o que somos...

Abel Maria

Nessa noite de estrelas...
É dia
Vem nós como meninos
Que
Prenda tão presente naquela cidadezinha
Íamos
Brincar nossas imaginações
Eu
Sapatinho na lareira
Aquecia aos vizinhos escutaram nossos sonhos
Esperança
Em cada janela cidadezinha

Abel Maria

No horizonte
Onde posso tocar na janela
De
Ver como elas falam da vida

Abel Maria

Escondo-me da palavra "Sim"
Porquê...
Perdi a presença da vida
Declarando em berros o "Não"
Porquê...
Ganhei mais pessoas afastadas
Ganho
Sustento permetido nas palavras
Aquele moleque de pés descalços para o futuro
Há muito que o baloiço
Leva minhas esperanças em ensinar
Onde ponho minhas mãos firmes
Nessas cordas para o vento não desviar o direito em respirar
Olho
Vastidão que me aplaude meus caminhos
Sozinho
Viajando pensamentos
Naqueles que tem memória em guiar o escuro das estrelas
Abraço amigo
Onde o que você aprendeu há muito esqueci
Vem Mestre

Abel Maria

Rascunho

1. Presumo...Que seja um pão.
2. Receio...Aquela vida que não vi.
3. Rezo...O abismo não foi me buscar.
4. Aleluia...Me serviu sem me convidar.
5. Essa...Palavra não me diz amém.
6. Pecador...Vem de longe o vento.
7. Aplaudido...Pescador navegantes rugas.
8. Oiço Uma certa nudez de Outono.
9. Emotivo...Esse dia pessoas novas no ano.
10. Muda...Amanhã ser alguma atitude.
11. Recomendo...Imitar seus exemplos sem seus sapatos.
12. Em...Mim a última linha me agrada.
13. Nós...Vamos vencer filhos doutros
14. Vem...Chocado aquele momento relembrar.
15. Igreja...Castigo em saber falar os sinos.
16. Acuda...Pobre fé exausta.
17. Leia...Terços que atravessam oceanos.
18. Ponha...Um pouco de si nos muros altos.
19. Coração...Palpita meu anjo da guarda
20. Escolha...Aquelas palavras numa citação anónima.
21. Agora...Meu amigo vai lhe dar um nome.
22. Baptizo...Empolgante menino de rua.
23. Acolhe...Este momento divino sem lua.
24. Bem...Vou dizer que estou feliz no lugar.
25. Chegou...O momento em sernos menores anjinhos.

Abel Maria

Senhor
Naquela casa diminua o que nós somamos
Senhor
Compre promessas e nós vendemos
Senhor
Nós vemos mal sua magreza de sacrifícios
Senhor
Faça ruir ou chegar nossos dias...
Senhor
Faça ruir ou chegar nossos dias...
Senhor
A esmola dos que não precisam ressuscitou
Senhor
Não dê uma esmola
Sem ele o que fazer!
Senhor
É preciso neste caminho ouvir longe de alguém
Senhor
Alegando se dá ou não sua Leitura.

Abel Maria

Tenho Tanto Sentimento


Tenho tanto sentimento
Que é freqüente persuadir-me
De que sou sentimental,
Mas reconheço, ao medir-me,
Que tudo isso é pensamento,
Que não senti afinal.
Temos, todos que vivemos,
Uma vida que é vivida
E outra vida que é pensada,
E a única vida que temos
É essa que é dividida
Entre a verdadeira e a errada.
Qual porém é a verdadeira
E qual errada, ninguém
Nos saberá explicar;
E vivemos de maneira
Que a vida que a gente tem
É a que tem que pensar.

Fernando Pessoa

SONETO LXXXVIII
Quando me tratas mau e, desprezado,
Sinto que o meu valor vês com desdém,
Lutando contra mim, fico a teu lado
E, inda perjuro, provo que és um bem.
Conhecendo melhor meus próprios erros,
A te apoiar te ponho a par da história
De ocultas faltas, onde estou enfermo;
Então, ao me perder, tens toda a glória.
Mas lucro também tiro desse ofício:
Curvando sobre ti amor tamanho,
Mal que me faço me traz benefício,
Pois o que ganhas duas vezes ganho.
Assim é o meu amor e a ti o reporto:
Por ti todas as culpas eu suporto.

William Shakespeare

SEGREDO

Sei um ninho.
E o ninho tem um ovo.
E o ovo, redondinho,
Tem lá dentro um passarinho
Novo.

Mas escusam de me atentar:
Nem o tiro, nem o ensino.
Quero ser um bom menino
E guardar
Este segredo comigo.
E ter depois um amigo
Que faça o pino
A voar...

Miguel Torga

Procure e evite mulher...
Inventei a vergonha?
Meus irmãos
Meus amigos
Alguns
Colegas e camaradas
Só de uma coisa tenho a certeza o inimigo!
Os
Que ocupam devidamente seus lugares
Tanto trabalho procura de poucos
Preguiça!
Amadamente
A lua
Cansou de poesias
Arrependido
Eu
Matei o meu coração
Porque amei...
No comício prometa mas não diga nada
Muitas e muitas bocas se beijam
De quem eu não sei...

Abel Maria

Poesia escrita para o evento "Viva a Poesia". Declamada pelo autor no dia 27 de de Março de 2009, na Biblioteca Municipal José Régio, em Vila do Conde

Escondo-me da palavra "Sim"
Porquê...
Perdi a presença da vida
Declarando em berros o "Não"
Porquê...
Ganhei mais pessoas afastadas
Ganho
Sustento permitido nas palavras
Aquele moleque de pés descalços para o futuro
Há muito que o baloiço
Leva minhas esperanças em ensinar
Onde ponho minhas mãos firmes
Nessas cordas para o vento não desviar o direito em respirar
Olho
Vastidão que me aplaude meus caminhos
Sozinho
Viajando pensamentos
Naqueles que tem memória em guiar o escuro das estrelas
Abraço amigo
Onde o que você aprendeu há muito esqueci
Vem Mestre
Aquelas páginas de dez folhas
Poucos sabem fechar o livro nas suas linhas tortas
O prego
Em cada mão suporta dores que não nos levam enfermos
Dói
Boas vindas ajudadas nesse mundo não merecido
Feiura que não teve nenhuma chance inteligência
Apaguem as velas e descubra a cor do meu corpo
Neste dia...
Evolua seu nome
Importe
Num abraço prenda descoberta numa cama amarrada
Que não levantam sonhos
Escolha seu prato preferido gabando sopa dos pobres
Dum vento quente
De uma brecha há alguém sua sombra da janela embaciada
Ninguém
Ver de dentro a voz que vem lá de fora
Passos até ao cimo do monte frio mil anos de histórias
Sento...
Capela
No último banco olho o altar sem gestos cansados
Rezando
Inertes Santos
Vem um cestinho ouço tirilintar esmolas
Vencido...
Prometi que não mentiria que a você voltava
Um dia
É
Mais de muitas horas
A
Flor chora num sorriso divino
Deslumbre
E chore... Quando não vê-lo Menino Jesus

Abel Maria

Tudo
Que toco foge
No
Ventre não deixa fugir
É
Um encontro amigável
Nesta
Razão moral e humana
Sente
Na cadeira da avó seu suor foi igual na vida.